Por Tiago Hakiy - 14 abr 2021 - 3 min
Em comemoração ao Dia do Índio (19 de abril), o Coletivo Leitor convidou Tiago Hakiy, descendente do povo Sateré-Maué, do estado do Amazonas, e autor da obra O canto do uirapuru, a dar seu depoimento como artista indígena que com sua arte busca sensibilizar a sociedade não apenas para a violência exercida contra os povos originários mas também contra o planeta, ameaçando o futuro da vida na Terra.
Os povos originários sempre tiveram sua existência intimamente conectada à natureza: dela e por ela vivem. As árvores são suas casas, os rios são seus caminhos, o canto dos pássaros são vozes que chegam e presenteiam a beleza do mundo. Desde criança o indígena aprende a cuidar da floresta, pois sabe que sua vida vai estar sempre enraizada em cada ser vivente que de alguma forma contribui para sua existência.
A mãe Terra em parte se encontra doente. A ganância humana a tem ferido com o ferro de sua insensatez: florestas, rios e toda uma cadeia da nossa biodiversidade. E essas ações têm sido deletérias à forma de viver de diversos povos indígenas, que muitas vezes dependem exclusivamente do meio natural preservado em plenitude.
É notório que o indígena hoje não está apenas nas aldeias. Ele está presente em várias esferas da sociedade, não está impune às fraquezas do ser humano, como também está compartilhando o que de melhor sua cultura milenar tem a oferecer para a vida. É do compartilhamento de sua cultura que muitos indígenas se utilizam para sensibilizar a sociedade contra muitas barbáries cometidas contra o modo de viver de muitos povos.
Pertenço a um povo secular, de uma cultura singular, com suas particularidades na alimentação, nos cantos sagrados, nos grafismos ancestrais. Não podemos deslembrar que, no Brasil, existem mais de uma centena de povos indígenas, cada um com suas singularidades. É nesta diversidade plural que desejamos ser compreendidos e respeitados. Não somos um só povo, desenhado e caricaturado por não indígenas e disseminado nos livros escolares há muito tempo. Somos diversos povos, cada um com sua forma de ver e sentir a natureza, cada um com sua identidade cultural.
Muitos parentes (nós, indígenas, nos tratamos dessa forma, pois acreditamos que todos se irmanam) estão construindo suas vivências pautadas em vários segmentos da sociedade, contribuindo de alguma maneira para mudar o olhar do Brasil a respeito das nações indígenas, detentoras de uma cultura que não é pior, nem melhor, mas apenas diferente. É nessa diferença que desejamos ser compreendidos e respeitados. Sou um escritor, minha pauta cultural é a palavra, pois sou fruto da oralidade, fruto de resistência e tradição.
Escrevo para perpetuar a memória ancestral, escrevo pela continuidade da existência de nossos antepassados, escrevo para compartilhar a literatura que nasce no coração da floresta. Escrever é meu ato de resistência contra todas as barbáries impetradas contra nossos povos, mas também escrevo para cantar a beleza da natureza: o som da brisa, o deslizar leve e supremo das águas límpidas e naturais, o canto dos pássaros, o olhar de cuidado presente em cada árvore em pé dançando no calor do vento.
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